sexta-feira, abril 23, 2010

Inovação


Você ainda compra videocassete

Marcelo Freitas

. Artigo publicado na revista Gestão Educacional / edição de abril 2010


É lógico que você se lembra daquele aparelho que ficava em cima da televisão e que a cada ano era objeto de disputa dos seus fabricantes para lançá-lo com um número maior de... “cabeças”. Lembra disso?

Então... onde foram parar todas aquelas cabeças? Hoje, provavelmente, esse mesmo aparelho está encostado em algum canto da estante, servindo como aparador para um daqueles vasinhos de violeta. Ele foi atropelado por tecnologias inovadoras. Sua cadeia de produção foi alvo de um fenômeno chamado descontinuidade. A inovação trouxe a ruptura entre a tecnologia usada e uma nova alternativa: melhor, mais interessante, mais atraente e... mais eficiente.

Esse fenômeno acontece sempre que uma tecnologia vai se tornando obsoleta e seus resultados não são mais passíveis de grandes melhorias através de aperfeiçoamento. Não há mais saltos qualitativos perceptíveis diante dos olhos do consumidor. Você seria capaz de distinguir um videocassete de 8 cabeças de um de 10?

Toda essa reflexão foi apenas para trazer à tona um questionamento: o modelo educacional de hoje, não seria um grande videocassete de 12 cabeças?

A sociedade mudou. Os conceitos mudaram. Mas o conceito de ensino- aprendizagem adotado pela maioria das escolas ainda caminha na perspectiva dos melhoramentos contínuos. Estão tentando melhorar o desempenho de um sistema que já está exaurido. Não responde mais às demandas do mundo atual. A situação já não comporta mais aperfeiçoar. É preciso mais que isso, é preciso reinventar!

Por onde quer que eu ande, ouço sempre os mesmos debates, as mesmas idéias, os mesmos argumentos. Ano após ano, as escolas apresentam suas campanhas de marketing baseando-se nas mesmas premissas. Formação integral, ensino de qualidade, valores para a vida e por aí vai. Nada realmente inovador no horizonte.

Como conseqüência, os resultados também são os mesmos: pessoas e profissionais despreparados para enfrentar os desafios da vida e do trabalho. Nada de muito diferente a esperar.

Grandes redes tentam inserir, ainda que timidamente, um sopro de novos ares através da adoção de tecnologias de mídia mais recentes, recheando com elas seus materiais didáticos. As premissas, contudo, permanecem as mesmas. São roupas novas a enfeitar velhos manequins. Até mesmo as instituições de ensino tradicionais, que ainda podem se dar ao luxo de construir novas instalações, o fazem sobre as mesmas premissas de educacionais do passado, velhas plantas suportadas por antigos modelos de negócio e sustentabilidade. Vez por outra inserem um ponto de internet em sala de aula ou uma lousa eletrônica, para dar ares de atualidade. Apenas maquiagem... Mais uma cabeça a povoar o videocassete educacional.

As escolas e seus profissionais não percebem que a sociedade clama pelo “Ipod” da educação. Um salto de valor, algo realmente inovador, que deixe para trás o esgotado modelo baseado num mundo onde a grande novidade era a revolução industrial. Precisamos de um Steve Jobs na educação, que traga um sistema novo, com novas metodologias, novos modelos de negócio. Uma reinvenção partindo da estaca zero.

Exemplos de empresas como o Google, a Apple e outros ícones da nova era, podem se juntar às experiências bem sucedidas de empresas que souberam se adaptar ao novo ambiente, como os bancos e aeroportos, servindo como inspiração para as escolas. Para que tal aconteça, entretanto, é necessário que gestores educacionais e educadores se dispam das “verdades absolutas” que vestem e busquem, em outras áreas, as respostas que o segmento educacional não é mais capaz de fornecer.

De nada adianta tentar construir uma nova escola com as velhas ferramentas. Não adianta ir à guerra armado de velhos fuzis. É preciso renovar e reforçar o exército com gente nova. Mentes ainda não contaminadas pelas bulas do passado. É vital afastar os curandeiros antigos, prescritores de remédios que não fazem mais efeito.

Nessa perspectiva, é importante recrutar gente de fora do segmento educacional. Pessoas com paradigmas diferentes, premissas novas. Mas nessa empreitada, a abertura para o novo tem de encontrar espaço nas cabeças brancas dos guardiães atuais. São eles que terão de abrir os braços para inovações e as contestações embutidas em novas abordagens.

Seguramente terão de conviver com o inusitado. Com o imprevisível. Com ações e reações frutos de novos conceitos e teorias. Ainda assim, cabe-lhes sustentar um ambiente de caos aparente, fruto da insegurança dos profissionais mais conservadores. Esses, de uma forma ou de outra, terão de ser cooptados. Ou simplesmente serão postos de lado, mesmo que criem movimentos de resistência. Tudo isso faz parte do novo. Da mudança...

Não imaginávamos, anos atrás, que precisaríamos de coisas como internet, celular e Ipod, até que eles fossem inventados e incorporados ao nosso cotidiano. Hoje não conseguimos imaginar como viver sem eles.

Seja como for, é chegado o momento de repensarmos o que é, de fato, necessário fazer: aperfeiçoar o que aí está ou reinventarmos o ambiente educacional.

Considerando o momento atual, seja qual for a escola e aonde quer que ela esteja, ainda estamos comprando videocassetes!