segunda-feira, junho 04, 2018

Edtechs e as escolas

Uma startup chamada escola 
Por Marcelo Freitas

O universo das startups está revolucionando os mercados. 
Não seria o momento de dar à escola um novo modelo de negócios? 


Você sabe o que é uma inovação disruptiva? Inovações disruptivas são fruto de novas cabeças, nascem de oportunidades apresentadas pelo mercado e provocam mudanças bruscas nos segmentos de negócios onde surgem. Isso porque a aposta na inovação disruptiva significa criar tecnologias, produtos e serviços mais acessíveis, em novos modelos de negócios, que rompem com o status quo existente.

Nas últimas décadas, a tecnologia alterou a natureza dos mercados de forma inesperada e, muitas vezes, radical, o que provocou o surgimento de inúmeras oportunidades. Nessa nova arena, o “adequado” já não é mais suficiente. Ser “grande” não é mais sinônimo de ser imbatível e os ciclos de vida dos produtos passaram de anos, para meses.

Ao mesmo tempo, a tecnologia tornou possível atender diferentes públicos de maneira simultânea e singular, na medida em que os bits foram tomando o lugar dos meios físicos, em escala crescente. E nesse caso, qual o impacto sobre as escolas tradicionais e seus modelos de negócios?

Já faz tempo venho repetindo, quase como um mantra, que a Educação, enquanto “indústria”, corre sério risco de se ver engolida por empresas dos segmentos de tecnologia e de entretenimento. Pois o que parecia ser apenas fruto de uma leitura estratégica, na medida em que o tempo passa, vai caminhando para se tornar uma realidade.

Com novos programas profissionais, gigantes da tecnologia como Amazon, Google, Microsoft, entre outros, estão aumentando sua presença no segmento educacional. Ela acontece na oferta de aplicativos, ferramentas e serviços, mas também está presente na forma de uma crescente participação em plataformas de Ensino à Distância, como edX e Coursera, com a oferta de mais cursos direcionados a pessoas que buscam qualificação em ferramentas tecnológica, ou assuntos os mais diversos.

Com esse movimento buscam também ampliar a oferta de profissionais qualificados para abastecer o segmento de tecnologia, qualificando desenvolvedores para utilizarem seus próprios sistemas. Dessa maneira, estão se dedicando a oferecer aos estudantes a oportunidade de desenvolver novas habilidades profissionais em áreas críticas como a computação em nuvem. Ao mesmo tempo, ampliam sua influência no segmento educacional, ditando quais conteúdos devem ser desenvolvidos e, mais que isso, ganhando espaço no mercado de Ensino.

Internamente, também, as gigantes já estão revendo suas estruturas para melhor se qualificarem. A Amazon, por exemplo, contratou uma especialista da Escola de Graduados em Educação, de Stanford, para ser a nova Diretora de Ciência e Engenharia de Aprendizagem. Ela se encarregará de capacitar a enorme força de trabalho da Amazon, mas também levará para o segmento de tecnologia a expertise nos processos de ensino e aprendizagem. Esse movimento estratégico vai tornando a Amazon, aos poucos, sua própria universidade. 

Outro exemplo: o novo Microsoft Professional Program in IT Support, oferece um plano de estudos composto de 13 cursos e 1 projeto aplicativo final, através da plataforma edX. Mais espaço comercial, participação de mercado e competência educacional.

Nesse processo, as empresas de tecnologia vão se apropriando da expertise das instituições educacionais para, em seguida, oferecer novos e inovadores formatos de cursos, produtos ou serviços. Um exemplo dessa estratégia de apropriação de competências foi apresentado pela gigante russa Yandex, que anunciou recentemente a associação com a Universidade de Tel Aviv, com vistas ao lançamento de um programa curricular de TI.

Tal situação traz consigo um fato novo: as certificações vão ganhando espaço no mundo do trabalho e, aos poucos, tomando o lugar dos diplomas. Uma silenciosa mudança disruptiva, que vai tirando do segmento educacional a primazia dos processos de ensino-aprendizagem, assim como retira das escolas a referência como templo do conhecimento.

Todo esse movimento chama também a atenção de outros agentes, que se movimentam na mesma direção. É o caso de grandes investidores, que buscam ampliar suas participações em startups, em especial aquelas que lidam com inteligência artificial, cuja utilização é tida por muitos como sendo responsável pela próxima grande revolução no campo da Educação. Andrew Ng, considerado o guru da Inteligência Artificial – IA, anunciou a criação de um fundo, com aporte inicial de 175 milhões de dólares, para apoiar startups focadas em IA. O primeiro passo foi criar uma incubadora de startups dedicadas a construir empresas transformadoras e melhorar a vida das pessoas.

Andrew Ng foi professor de Ciências da Computação na Universidade de Stanford e cofundador da plataforma Coursera. Segundo ele,

“Faz aproximadamente 100 anos que a eletricidade transformou 
todas as indústrias importantes. A Inteligência Artificial já avançou ao 
ponto em que detém o mesmo poder”. 
Andrew Ng, na conferência AI Frontiers.

Considerando todo esse movimento estratégico, não seria o momento das Instituições Educacionais repensarem seus modelos de negócios, seus serviços e produtos, e começarem a se movimentar, criando barreiras de entrada? Movimentos disruptivos são silenciosos, começam pelos flancos até que tenham construído uma sólida posição de ataque. Uber, AirBnb e outras estão aí para comprovar. Por que não antecipar e transformar a escola numa “grande startup”?