Jogando
com a educação
Marcelo Freitas
Seja como projeto, negócio ou processo, a educação está diante de uma
realidade que a coloca frente a frente com inúmeros desafios. E ao invés de
olhar a situação como ameaça, prefiro ver o leque de oportunidades que se
descortina. Um relatório[1] sobre
tendências, cujo trecho transcrevo a seguir, apresenta a realidade do ponto de
vista empreendedor, ou seja, como negócio:
“Até o momento, muitos consumidores das Américas do Sul & Central
se resignaram com a falta de acesso a novas ideias, conhecimento e educação
formal e de qualidade; que, para a maioria dos cidadãos, tem um custo muito
elevado.
Mas a realidade está mudando: o mundo digital colocou uma quantidade
infinita de informação ao alcance de todos; os empreendedores se tornaram os
novos “superstars”; e a nova e mais bem educada classe-média agora busca
desenvolvimento e realização pessoal continuada.
Dois sinais dos tempos:
Em comparação com os consumidores internacionais, os consumidores das
Américas do Sul & Central são os que mais valorizam o ensino superior: 94%
dos brasileiros acreditam que o acesso ao ensino superior é vital; seguidos por
92% dos mexicanos, 92% dos chilenos e 91% dos venezuelanos – contra a média
global de 78%. (Nielsen, setembro de 2013)
6 entre os 10 países em que os consumidores estão mais inclinados a
comprar produtos e serviços produzidos por empresas que apoiam a educação se
concentram nas Américas do Sul & Central (Colômbia: 90%, Brasil e
Venezuela: 88%, Peru: 87%, Chile 83%). (Nielsen,
setembro de 2013)”.
Educação, portanto, é a oportunidade da vez e os consumidores estão
ávidos por qualidade e inovação. Eis aí um mercado e tanto para quem deseja
navegar em oceanos azuis. E de olho nele estão novos entrantes, como as
empresas de entretenimento e tecnologia. Gameficação
e MOOC’s não estão aí por acaso.
Por outro lado, reconhecemos que a oferta de serviços educacionais,
tanto no seu formato quanto no conteúdo, já não mais atende às expectativas da
sociedade em franca mudança de paradigmas. Algumas das principais premissas desta
nova realidade educacional já apresentamos em palestras e artigos anteriores,
mas não custa nada lista-los aqui:
·
Dos horários fixos para as atividades dinâmicas;
·
Dos conhecimentos adquiridos dentro da sala de
aula para aqueles obtidos fora da escola;
·
Do conhecimento teórico ao conhecimento aplicado
na prática;
·
De respostas certas às perguntas abertas;
·
De problemas fictícios para os desafios reais;
·
Da aprendizagem passiva para uma participação
ativa;
·
De aprender com a cabeça para aprender com o
corpo inteiro;
·
De trabalhos individuais para a solução de
problemas em conjunto;
·
Do professor como especialista onisciente para o
professor como facilitador;
·
Da sala de aula formal a oficina experimental.
Diante de todo esse cenário, tenho apresentado aqui neste espaço
algumas experiências inovadoras que acontecem mundo afora, sejam elas em
escolas particulares, fundações, projetos de empresas ou na própria escola
pública.
Uma delas, que considero interessante por unir várias das
características e tendências citadas anteriormente, é o da Quest to Learn (Q2L).
Quest to Learn é um colégio público de Nova York. É, nas palavras dos
responsáveis pelo projeto, “a primeira escola do mundo a ter 100% de seu
currículo baseado em jogos”. “Não somos uma escola dirigida pela tecnologia,
mas pelo engajamento”, afirma Waniewski. Para o pesquisador Tupy, da USP, “os
recursos eletrônicos não são o fim e sim um meio para desenvolver temas como
gestão de projeto, inovação, empreendedorismo”[2]. A Quest
to Learn vem tendo os melhores resultados do sistema educacional de Nova York,
segundo a matéria da revista Época Negócios.
Como boa parte das pessoas já percebeu, o sistema escolar tradicional,
baseado na memorização, molda crianças para empregos tradicionais. Com os
games, o objetivo é prepará-las para trabalho em equipe, soluções criativas,
gerenciamento do tempo e estímulo ao pensamento independente, padrões e
necessidades das novas empresas.
Para conhecer um pouco mais, veja uma síntese do projeto, a seguir.
Quem sabe você, caro leitor, não se anima e dá uma guinada na sua escola ou
rede de ensino?
“Na Q2L não existem disciplinas como matemática, gramática ou história.
Todos os assuntos são interligados em cinco matérias.
Missões e
desafios (10 semanas)
|
Fase do chefe (2
semanas)
|
Wellness: a matéria “Bem-estar” é voltada para fazer os
estudantes pensarem em saúde – física e mental. Além de missões com
exercícios físicos individuais e coletivos, também trata de temas como
alimentação saudável, condicionamento mental, relações sociais e saúde
emocional.
The way things work: União de ciências e matemática. ‘Como as
coisas funcionam’ faz de cada aluno um inventor. Algumas missões incluem
desmontar aparelhos, entender como funcionam e remontá-los com modificações e
aperfeiçoamentos.
Sports for the mind: Aqui se concentra a maior parte do
material digital da escola. Além de criar seus próprios videogames, os alunos
produzem vídeos e aprendem a conectar conteúdos de diversas áreas.
Codeworlds: As aulas de “Códigos” mostram as diversas formas
de entender o mundo, pela união dos números da matemática, das letras e da
forma como ambos se juntam a manifestações artísticas de músicas e pintura.
Being, space and places: História e Estudos Sociais são
explorados por meio de material produzido pelos alunos, como histórias em
quadrinhos, jogos de tabuleiro, teatro, cartas e textos de ficção.
|
Nas duas semanas de desafio final, os alunos precisam reunir os
conhecimentos aprendidos nas missões para convencer os professores de que
podem passar de fase. “
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Ao entrarem na escola, cartelas com dez mandamentos necessários para
desenvolver soluções criativas e conviver com os demais membros da comunidade
são distribuídas aos alunos. Veja quais são esses mandamentos:
- “ Todas as ideias podem ser melhoradas: Fique aberto às mudanças e às oportunidades de tornar suas ideias melhores.
- Diversidade cria equilíbrio: Ser diferente é ok. Suas características únicas ajudam a tornar a equipe mais forte.
- Vença e perca com elegância: A derrota dá oportunidade de melhora, a vitória comprova o acerto;
- Tenha respeito pelos próximos: Todos são importantes para a manutenção de uma comunidade coesa e equilibrada.
- Colaborar faz diferença: Duas cabeças pensam melhor que uma. Nós precisamos do apoio e das ideias dos outros para vencer.
- Entre no jogo: Não tenha medo de sujar as mãos! Aprenda a calcular os riscos e a planejar a sua estratégia.
- Experimente: Use sua imaginação e criatividade para inventar; use os recursos da escola para dar vida às suas ideias.
- Ninguém fica à margem: Todos devem lembrar um ao outro por que fazem parte da equipe e como são importantes para ela.
- Seja persistente: Defenda a ideia em que você acredita e não desista. Se você cair, levante-se e tente novamente.
- Lidere pelo exemplo: Demonstre o comportamento positivo que você gostaria de ver nos outros. “
Será que é tão difícil assim?